Por Clara Days:
Ideias-chave: gerir a mudança pela regra; entre as voltas da vida, agarrado à tradição; ideologia em movimento.
Nada como a presença do Hierofante para nos agarrar às raízes, ou à matriz cultural, ideológica e moral a que pertencemos. Há sempre um apelo da tradição, dos costumes, que se traduz em concessões pessoais que fazemos, para garantir um lugar seguro entre os nossos. Mas quando este Arcano vem acompanhado pela Roda da Fortuna, há que esperar que as marés da vida, na sua permanente e cíclica mudança, desafiem ou provoquem os aspectos que reflectem essa nossa pertença.
Para cima ou para baixo? Em que fase do movimento perpétuo me situo, hoje? Mudam os tempos, mudam as vontades, muda-se o ser, muda-se a confiança… A Roda traz um dinamismo cujo ritmo pode variar, mas em que as alternâncias são quase previsíveis, como o virar das estações do ano. Agarro-me àquilo que acredito ser uma verdade inquestionável, para ter um centro de referência – assim parece ser a mensagem das cartas para esta semana.
Para sobreviver bem às reviravoltas do meu andamento, preciso então agora de um eixo de estabilidade moral. A crença, sejam na divindade, na bondade humana ou na harmonia universal, dá-me esse ponto de apoio. Na verdade, não há como evitar a evolução, estamos sempre num ponto do ciclo de transformação e revisão, de ascenção e queda, de crescer e retrair. Por muito maduros que sejamos (e o peregrino Louco do Tarot não é propriamente a imagem da maturidade), há sempre um desejo de estabilidade que assim nos é negado, e assim surgem os sistemas de referência moral e ideológica, as religiões, outros tantos suportes psicológicos colectivos, que tanto contêm como apoiam.
Vou então vivendo os trambolhões da viagem, bem agarrado à âncora do grupo a que pertenço ou a que escolhi pertencer. Essa âncora é aqui simbolizada pelo Hierofante, o mestre iluminado que guarda os segredos e a cuja orientação me entrego, sem questionar. Pode assim a Roda pôr-me de pernas para o ar, que me aguentarei, ou é esse o meu propósito. Como um prisioneiro de guerra que resiste à tortura do inimigo pela força da sua razão, viajo na Roda da Vida, mas estou centrado. Avalio tudo filtrado pela minha crença e isso ajuda-me a relativizar o impacto das mudanças, a reposicionar-me perante o sucesso ou o fracasso, não sobrevalorizando o primeiro e suportando melhor o segundo.
Na Roda da Vida, tendo por mestre um Hierofante, assim estarei: se me segurar àquilo que acredito ser importante e verdadeiro, venham os ventos, venham as tempestades, venha também a bonança – por muito que mude o meu lugar no espaço, em espírito estarei tranquilo.
Imagem : Ostara Tarot, colaborativo, desenhos de Julia Iredale, 2017

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